segunda-feira, 10 de setembro de 2007

A imprensa e os operários (Gramsci)

A imprensa e os operários (*)

Antonio Gramsci

São dias de publicidade para as assinaturas. Os gerentes e executivos da imprensa burguesa arrumam suas vitrines, passam uma mão de verniz sobre suas tabuletas e chamam a atenção dos passantes (isto é, dos leitores) sobre a sua mercadoria. A mercadoria é aquela folha – de quatro ou seis páginas – que toda manhã, ou toda tarde, vai injetar no espírito do leitor os modos de sentir e de julgar os fatos da atualidade política que melhor convém aos produtores e vendedores de papel impresso.

Queremos tentar falar, especialmente aos operários, sobre a importância e a gravidade daquele ato – aparentemente assim, tão inocente – que consiste em escolher o jornal que se pretende assinar. É uma escolha cheia de artimanhas e perigos, que deveria ser feita com consciência, com critério e só depois de amadurecida reflexão.

Antes de qualquer coisa, o operário deve negar decididamente qualquer solidariedade à imprensa burguesa. Deveria recorda-se – sempre, sempre e sempre – que a imprensa burguesa (qualquer que seja sua coloração) é uma ferramenta de luta movida por idéias e interesses que contrastam com os seus. Tudo o que se publica é constantemente influenciado por uma única idéia – servir à classe dominante –, o que se traduz indiscutivelmente em um fato: combater a classe trabalhadora. E, de fato, da primeira à última linha, a imprensa burguesa sente e revela esta preocupação.

Mas o melhor – isto é, o pior – reside nisto: que em vez de pedir dinheiro à classe burguesa para sustentar a obra de impiedosa defesa em seu favor, a imprensa burguesa consegue fazer-se pagar... pela própria classe trabalhadora que sempre combate. E a classe trabalhadora paga, pontualmente, generosamente.

Centenas de milhares de operários dão regularmente, todos os dias, o seu dinheirinho para a imprensa burguesa; fazendo – desta forma – aumentar o seu poder. Por quê? Se perguntarem ao primeiro operário que avistarem no trem ou na rua – com a folha burguesa desdobrada à sua frente – ouvirão responderem: "É porque preciso saber as novidades". E não se lhe passa sequer pela cabeça que as notícias – e os ingredientes com os quais são cozidas [as notícias] – podem ser expostas com uma arte que dirija o seu pensamento e influencie seu espírito, em determinado sentido. E, no entanto, ele sabe que tal jornal é reacionário, que outro é interesseiro; que o terceiro, o quarto e o quinto estão ligados a grupos políticos que têm interesses diametralmente opostos aos seus.

Todos os dias, pois, abre-se a este mesmo operário a possibilidade de poder constatar pessoalmente que a imprensa burguesa reapresenta os fatos – mesmo os mais simples – de modo a favorecer a classe e a política burguesa; em prejuízo da política e da classe operária. Estoura uma greve? Para a imprensa burguesa os operários são sempre enviesados. Há uma manifestação? Os manifestantes – apenas porque são operários – são sempre turbulentos, sectários, baderneiros. O governo aprova uma lei? É sempre boa, útil e justa, mesmo se é... o contrário. Desenvolve-se uma luta eleitoral, política ou administrativa? Os melhores candidatos e programas são sempre dos partidos burgueses.

E não falemos de todos aqueles fatos que a imprensa burguesa ou silencia, ou deturpa, ou falsifica; para enganar, iludir e manter na ignorância os leitores operários. Apesar disso, a lamentável anuência do operário em relação à imprensa burguesa é sem limites. É preciso reagir contra ela e recordar ao operário a exata avaliação da realidade. É preciso dizer e repetir que aquele dinheirinho lançado distraidamente na mão do jornaleiro é um projétil encomendado à imprensa burguesa que o lançará depois, no momento oportuno, contra a massa operária.

Se os operários se convencessem desta verdade mais elementar, aprenderiam a boicotar a imprensa burguesa, com a mesma disciplina e coesão com que a burguesia boicota a imprensa operária, isto é, os jornais socialistas. Não contribuam financeiramente com os jornais burgueses que são seus adversários: eis qual deve ser a nossa palavra-de-ordem neste momento que é caracterizado pela campanha de assinaturas feita por toda a imprensa burguesa. Boicotem-na, boicotem-na, boicotem-na!


(*) Gramsci, Antonio (1916). I giornali e gli operai, In: Avanti!, ediz. Piemontese, 22/dic./1916 (racolto In: Scritti Giornalistici. Pagine Scelte. Roma: Associazione Culturale i Centro di Documentazione Politica Albano Corneli, 1995. Tradução livre de Roberto Della Santa Barros.

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Um comentário:

Unknown disse...

Ow já baixei o filme, já feio com legendas em portugues e com boa qualidade, só que é em widscreen. que dia vc quer?

abraço